Onofre, o porteiro

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Onofre, porteiro há mais de vinte anos, sempre no mesmo prédio, já tinha visto um pouco de tudo acontecer naquele local. Seu período de trabalho oscilava entre turnos diurnos e noturnos, era substituído por Sandro, mais jovem no emprego, que tinha outra forma de agir com os condôminos daquele edifício tradicional da Rua Prestes, em sua cidade. Rodeado ainda de árvores antigas, o clima no entorno era bem familiar, apenas um pequeno mercado na esquina, a vizinhança era tranquila. No total, sete andares, em cada apartamento amplo, com três quartos, dois banheiros, sala, cozinha, um hall e sacadas que tinham noção do movimento da cidade.
Onofre ocupava um apartamento menor, térreo, onde morava com sua esposa Cenira, com quem era casado há vinte e cinco anos, não tiveram filhos. Tinham uma vida pacata, dividia os turnos com Sandro, mas o período que mais gostavam de ficar na portaria era à noite.
Quinta, hoje seria o turno da noite a seu cargo, levava consigo o pequeno rádio ainda a pilha, que escutava um programa de rádio que participava às vezes. Sua esposa trazia um lanche especial para que tivesse fôlego de ar a madrugada acordado.
Mas algo diferente aconteceu, uma moça muito nervosa apertou o interfone, pediu desesperada para entrar no prédio, com receio de que fosse algo premeditado. Onofre não quis abrir de imediato a portaria. Só que havia algo na voz dela que o fez atender ao seu pedido. Logo deu um copo d’água e acordou sua esposa Cenira, ela estava toda arranhada e sem a bolsa. Quando se acalmou, começou a contar o que aconteceu:

– Estava saindo do bar que vou, minhas amigas foram para outra balada. E quando caminhava duas quadras do meu prédio, que é próximo aqui, três sujeitos me cercaram e pegaram minha bolsa, disseram ser um assalto. Eu caí me machuquei, depois corri o mais rápido que pude e tive a ideia de apertar aqui no interfone. Agradeço muito, você salvou minha vida!
Onofre e Dona Cenira ficaram assustados com o relato de Renata, mas felizes de que tudo deu certo e algo bom, no fundo, quando ele quebrou o protocolo do condomínio. Dias se aram daquele susto grande para Renata, Seu Onofre nem lembrava mais tanto do ocorrido, dia normal na portaria do prédio, agora seu turno era de dia, entra e sai de moradores, nisso um entregador vêm com uma cesta chique, cheia de doces, algumas bebidas e um pacote bem embrulhado. Já de cara, ele pergunta:

– Qual andar é a entrega, meu filho? Para ver se o morador autoriza você a subir!
Ele logo responde: – Não, a moça disse que era direto na portaria, isso tudo aqui é para um senhor chamado Onofre.
Logo ele recebe a entrega, vai ler um cartão grande que tinha junto aos presentes:
“Seu Onofre, gratidão é algo que não se retribui com presentes. Não tenho palavras para agradecer o que o Senhor e a Dona Cenira fizeram por mim naquela noite. Apenas uns mimos e não esqueci o jantar que vocês me convidaram, em seguida apareço aí. Abraços, Renata.”
Em meio a tantas coisas, abre o embrulho maior, um rádio compacto potente, agora que liga na luz elétrica. No dia do susto, a guria nervosa derrubou e ele nem fez caso disso.
Bom, mais uma ronda na portaria, Sandro chega para cumprir seu turno, cumprimenta Onofre e logo repara: – De rádio novo?
Ele responde: – Isso foi presente daquela menina que ajudei naquela noite, nem esperava. Seis meses se aram mesa cheia, Cenira fazendo aquele assado que só ela mãos para isso, isso a campainha toca, abrem a porta, é Renata e seu namorado Henrique, trazendo um pudim de sobremesa. Boas conversas, uma amizade construída desde aquele apuro que a guria ou.
E, por obras do destino, mesmo sem eles programarem nada, dois anos mais tarde vem um jovem casal de moradores ocuparem o terceiro andar. Para alegria de Onofre e de Cenira, agora Renata, casada com Henrique, são seus vizinhos e ele segue como porteiro, agora com gente de casa morando no seu prédio.

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